LIVRO TERCEIRO
AS LEIS MORAIS
CAPÍTULO III
DA LEI DO TRABALHO
LEI DO TRABALHO
1. Necessidade do trabalho. - 2. Limite do trabalho. Repouso.
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Necessidade do trabalho
647. A necessidade do trabalho é lei da Natureza?
“O trabalho é lei da Natureza, por isso mesmo que constitui uma necessidade, e a civilização obriga o homem a trabalhar mais, porque lhe aumenta as necessidades e os gozos.”
675. Por trabalho só se devem entender as ocupações materiais?
“Não; o Espírito trabalha, assim como o corpo. Toda ocupação útil é trabalho.”
676. Por que o trabalho se impõe ao homem?
“Por ser uma consequência da sua natureza corpórea.
É expiação e, ao mesmo tempo, meio de aperfeiçoamento da sua inteligência.
Sem o trabalho, o homem permaneceria sempre na infância, quanto à inteligência.
Por isso é que seu alimento, sua segurança e seu bem-estar dependem do seu trabalho e da sua atividade.
Ao extremamente fraco de corpo outorgou Deus a inteligência, em compensação. Mas é sempre um trabalho.”
677. Por que provê a Natureza, por si mesma, a todas as necessidades dos animais?
“Tudo em a Natureza trabalha.
Como tu, trabalham os animais, mas o trabalho deles, de acordo com a inteligência de que dispõem, se limita a cuidarem da própria conservação.
Daí vem que o do homem visa duplo fim: a conservação do corpo e o desenvolvimento da faculdade de pensar, o que também é uma necessidade e o eleva acima de si mesmo.
Quando digo que o trabalho dos animais se cifra no cuidarem da própria conservação, refiro-me ao objetivo com que trabalham.
Entretanto, provendo às suas necessidades materiais, eles se constituem, inconscientemente, executores dos desígnios do Criador e, assim, o trabalho que executam também concorre para a realização do objetivo final da Natureza, se bem quase nunca lhe descubrais o resultado imediato.”
678. Em os mundos mais aperfeiçoados, os homens se acham submetidos à mesma necessidade de trabalhar?
“A natureza do trabalho está em relação com a natureza das necessidades.
Quanto menos materiais são estas, menos material é o trabalho.
Mas, não deduzais daí que o homem se conserve inativo e inútil.
A ociosidade seria um suplício, em vez de ser um benefício.”
679. Achar-se-á isento da lei do trabalho o homem que possua bens suficientes para lhe assegurarem a existência?
“Do trabalho material, talvez; não, porém, da obrigação de tornar-se útil, conforme aos meios de que disponha, nem de aperfeiçoar a sua inteligência ou a dos outros, o que também é trabalho.
Aquele a quem Deus facultou a posse de bens suficientes a lhe garantirem a existência não está, é certo, constrangido a alimentar-se com o suor do seu rosto, mas tanto maior lhe é a obrigação de ser útil aos seus semelhantes, quanto mais ocasiões de praticar o bem lhe proporciona o adiantamento que lhe foi feito.”
680. Não há homens que se encontram impossibilitados de trabalhar no que quer que seja e cuja existência é, portanto, inútil?
“Deus é justo e, pois, só condena aquele que voluntariamente tornou inútil a sua existência, porquanto esse vive a expensas do trabalho dos outros.
Ele quer que cada um seja útil, de acordo com as suas faculdades.” (643)
681. A lei da Natureza impõe aos filhos a obrigação de trabalharem para seus pais?
“Certamente, do mesmo modo que os pais têm que trabalhar para seus filhos.
Foi por isso que Deus fez do amor filial e do amor paterno um sentimento natural.
Foi para que, por essa afeição recíproca, os membros de uma família se sentissem impelidos a ajudarem-se mutuamente, o que, aliás, com muita frequência se esquece na vossa sociedade atual.” (205)
Limite do trabalho. Repouso
682. Sendo uma necessidade para todo aquele que trabalha, o repouso não é também uma lei da Natureza?
“Sem dúvida. O repouso serve para a reparação das forças do corpo e também é necessário para dar um pouco mais de liberdade à inteligência, a fim de que se eleve acima da matéria.”
683. Qual o limite do trabalho?
“O das forças. Em suma, a esse respeito Deus deixa inteiramente livre o homem.”
684. Que se deve pensar dos que abusam de sua autoridade, impondo a seus inferiores excessivo trabalho?
“Isso é uma das piores ações. Todo aquele que tem o poder de mandar é responsável pelo excesso de trabalho que imponha a seus inferiores, porquanto, assim fazendo, transgride a lei de Deus.” (273)
685. Tem o homem o direito de repousar na velhice?
“Sim, que a nada é obrigado, senão de acordo com as suas forças.”
a) - Mas, que há de fazer o velho que precisa trabalhar para viver e não pode?
“O forte deve trabalhar para o fraco. Não tendo este família, a sociedade deve fazer as vezes desta. É a lei de caridade.”
Não basta se diga ao homem que lhe corre o dever de trabalhar.
É preciso que aquele que tem de prover à sua existência por meio do trabalho encontre em que se ocupar, o que nem sempre acontece.
Quando se generaliza, a suspensão do trabalho assume as proporções de um flagelo, qual a miséria.
A ciência econômica procura remédio para isso no equilíbrio entre a produção e o consumo.
Mas, esse equilíbrio, dado seja possível estabelecer-se, sofrerá sempre intermitências, durante as quais não deixa o trabalhador de ter que viver.
Há um elemento, que se não costuma fazer pesar na balança e sem o qual a ciência econômica não passa de simples teoria.
Esse elemento é a educação, não a educação intelectual, mas a educação moral.
Não nos referimos, porém, à educação moral pelos livros e sim à que consiste na arte de formar os caracteres, à que incute hábitos, porquanto a educação é o conjunto dos hábitos adquiridos.
Considerando-se a aluvião de indivíduos que todos os dias são lançados na torrente da população, sem princípios, sem freio e entregues a seus próprios instintos, serão de espantar as conseqüências desastrosas que daí decorrem?
Quando essa arte for conhecida, compreendida e praticada, o homem terá no mundo hábitos de ordem e de previdência para consigo mesmo e para com os seus, de respeito a tudo o que é respeitável, hábitos que lhe permitirão atravessar menos penosamente os maus dias inevitáveis.
A desordem e a imprevidência são duas chagas que só uma educação bem entendida pode curar.
Esse o ponto de partida, o elemento real do bem-estar, o penhor da segurança de todos.
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